O Ministério do Interior de Angola está preocupado com a “violação grosseira” de princípios fundamentais dos cidadãos por alguns polícias, durante a sua actuação, nomeadamente a presunção de inocência. Por outras palavras, ao fim de 43 anos no Poder, o MPLA parece ter descoberto agora que – nos Estados de Direito – até prova em contrário todos são inocentes, até mesmo aqueles que não são do… MPLA.
A posição foi expressa pelo director de Comunicação Institucional e Imprensa do Ministério do Interior, subcomissário Waldemar José, que dirigiu hoje um seminário sobre “Princípios e Procedimentos Legais para Actuação Policial”, para comandantes municipais, distritais e efectivos com a missão principal de enfrentamento no combate à criminalidade.
“Há violação grosseira de alguns princípios fundamentais, alguns mesmo consubstanciados na Constituição da República, outros de leis que devem ser observados por todo o cidadão no geral e pela polícia, em particular, como um dos garantes da legalidade”, disse Waldemar José, em declarações à rádio pública angolana.
A tarefa de (re)educação dos polícias não vai ser fácil. Durante toda a vida “frequentaram” as aulas de “educação patriótica” e aprenderam que o MPLA é Angola e que, consequentemente, Angola é do MPLA, o que justifica a lei das leis do regime que legitimava a razão da força desde que fosse para benefício dos camaradas. Querar agora, ao fim de 43 anos, mudar essa regra não vai resultar. Mesmo que se pinte muito bem um burro com riscas, ele nunca será uma zebra.
O responsável do Ministério do Interior manifestou preocupação “com a observância daquilo que são questões fundamentais estatuídas na lei, desde o princípio da observância da legalidade, da presunção de inocência, e da aplicação da oportunidade, adequação, legítima defesa e outros”.
Waldemar José indicou que o seminário visa debelar e dar a conhecer aos efectivos que há determinadas infracções que não são de responsabilidade da actuação da polícia.
“A polícia deve saber distinguir quando é que está perante uma infracção de natureza cível, em que a responsabilidade não é efectivamente policial, e essas devem ser de exclusividade dos tribunais, mas para isso a polícia tem que saber encaminhar o cidadão”, frisou.
E a Polícia sabe muito bem como encaminhar o cidadão, usando para o efeito o cassetete, a pistola ou… ambos. E também sabe para onde o encaminhar. Para a esquadra, para e berma da estrada, para a lixeira ou para o refeitório dos jacarés.
O regime do MPLA é, de facto e de jure, um exemplo de tudo quanto contraria a democracia. Foi assim com Agostinho Neto, com José Eduardo dos Santos e assim continua agora, se bem com fardas novas. Não deixa, contudo, de satisfazer as verdadeiras democracias para quem é melhor, muito melhor, negociar com ditaduras.
Em alguma democracia séria, em algum Estado de Direito, se viu o Chefe do Estado Maior das Forças Armadas dizer, em plena campanha eleitoral, que um dos candidatos – mesmo que fosse o presidente da República – marcou a sua postura “por momentos de sacrifício e glória”, permitindo “a Angola preservar a independência e soberania nacionais, a consolidação da paz, o aprofundamento da democracia, a unidade e reconciliação entre os angolanos, a reconstrução do país, bem como a estabilidade em África e em particular nas regiões Austral e Central do continente”?
Não. Nas democracias seria impossível o Chefe do Estado Maior das Forças Armadas ter manifestações públicas deste género, tomando partido por um dos candidatos. Em democracia, os militares são apartidários.
Mas como Angola não é uma democracia, muito menos um Estado de Direito, isso mesmo aconteceu com o então Chefe Estado Maior das Forças Armadas, general Geraldo Sachipengo Nunda, que resolveu na mesma altura do seu camarada Ambrósio de Lemos, na altura comandante-geral da Polícia Nacional, fazer campanha em prol de um dos candidatos, no caso José Eduardo dos Santos.
Geraldo Nunda também disse que com a promulgação e entrada em vigor da Constituição da República de Angola “o país entrou numa nova etapa histórica do seu desenvolvimento”. Referia-se, recorde-se, à Constituição que aboliu a eleição presidencial.
É, aliás, admirável a forma como os militares angolanos estão sempre a falar da necessidade da preservação da paz (já cimentada há 17 anos), da Constituição e do culto a quem for presidente.
“A reconstrução nacional tem permitido a normalização da vida em todo o território nacional”, disse Geraldo Sachipengo Nunda, acrescentando que existuam sinais visíveis de um país que renascia após longos anos de guerra.
Que a guerra em Angola, como qualquer outra, deu cabo do país é uma verdade incontestável. Também é verdade que o país está a crescer, embora esse crescimento só esteja a ser feito para um dos lados (para aquele que está com o regime).
Mas será que ninguém neste MPLA se lembra da Angola profunda, daquela onde o povo, o nosso povo, é gerado com fome, nasce com fome e morre pouco depois com fome?
Mas será que ninguém neste MPLA se interroga sobre as razões que levam a que em Angola uns poucos tenham muitos milhões, e muitos milhões nada tenham?
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